Depois do vice-campeonato nas últimas três edições do Campeonato Carioca, eis que o botafoguense pode soltar o grito de campeão. E contra o mesmo adversário que o venceu em 2007, 2008 e 2009 com erros de arbitragem que o favoreceu.
Nesta segunda, o CANETA abre espaço para um botafoguense expressar o que sentiu depois que Gutemberg de Paula Fonseca apitou o final do jogo de ontem. Este é Igor Mello, estudante de Jornalismo da Uerj (está mais perto do diploma do que este que vos escreve) e dono do Blog "Cena Esportiva" (
http://cenaesportiva.blogspot.com/).
Resgate, Justiça e Redenção, eis que ressurge o Botafogo!
por Igor Mello
Quando o juiz apitou pela última vez no Campeonato Carioca deste ano senti, muito mais do que a alegria da conquista, os olhos marejados por um enorme alívio. Era a certeza de que uma década inteira de sacrifício, humilhações e decepções havia finalmente sido recompensada. Poucos botafoguenses vão reconhecer, porém – mais do que o estigma do chororô, do tri-vice e das outras gozações – nós nos sentíamos profundamente injustiçados pelos Deuses do Futebol.
E a injustiça atende por 2007. O time que hoje muitos odeiam e tratam como amarelão, perdedor e desequilibrado representou a volta da nossa ambição, a gana pela vitória, a confiança na nossa grandeza. Não havia adversário que aquele time não pudesse vencer, mas quis Sobrenatural de Almeida que nada conquistássemos. É coisa normal na história do Glorioso grandes times não ganharem aquilo que merecem...
Os dois anos que se seguiram confirmaram nossa sina. Mais dois vices, as mesmas coisas se repetindo. O que pintava como o renascimento parecia ter ido por água a baixo. Por isso a enorme desconfiança com este time de 2010.
Primeiro, pelas contratações de pouco impacto – exceção feita ao importantíssimo Loco Abreu. Depois, pela goleada acachapante sofrida frente ao Vasco. Naquele momento, muitos decretaram: “é o fim do Botafogo!”, “vamos cair este ano”, “com esse time não dá”. Mas então veio Joel Santana e tudo mudou.
Não só pelo folclore de motivador, mas por um grande trabalho como técnico de futebol. Joel armou um time consistente, aguerrido, batalhador e, mais importante, confiante. Fez das limitações a nossa força, a ponto de Andrade, técnico do rival, falar depois da eliminação na Taça Guanabara que “eles só cruzaram bolas na área”. O que o técnico rubro-negro não entendeu é que esta era nossa maior arma e, se isso funcionou, foi por competência, não por sorte.
A trajetória deste time foi impressionante. Ganhou no tempo normal todos os jogos decisivos e sempre marcou pelo menos dois gols. Foi o segundo maior pontuador do campeonato, mesmo depois do começo pífio... Cai por terra aí a imagem de um time medroso, um ferrolho que só fazia gols de cabeça. O domínio muitas vezes aparente nesses jogos era consentido por um time sem talento, mas muito inteligente, que chamava o adversário e o neutralizava, minando suas forças como se faz com um boxeador pegador para, só então, aplicar um ou dois golpes definitivos.
Contudo, o jogo final sintetiza tudo que esse grupo é. Ao contrário dos outros clássicos, o Botafogo foi absolutamente soberano em quase toda partida – menos no final do primeiro tempo e os instantes finais do segundo. A equipe fez primorosos primeiros 20 minutos, marcando, tomando a bola, pressionando. Merecia a vitória que não veio no primeiro tempo, talvez por conta de uma recaída nos minutos finais.
De qualquer forma, o time voltou do intervalo mais sereno. Não marcou tão forte, mas soube anular perfeitamente as jogadas rivais, que só ameaçava em lances fortuitos. Ninguém poderia imaginar que Fábio Ferreira ia anular de tal forma o Imperador Adriano. Nem que Fahel conseguiria, com a ajuda providencial do monstro Alessandro, equilibrar as coisas contra um Vagner Love endiabrado. A atuação sobretudo dos mais limitados foi impressionante: Fahel, Fábio Ferreira, Alessandro e Somália marcaram e jogaram como nunca; foram os grandes responsáveis pela vitória.
Grandes, mas não os principais. O protagonismo no drama dessa decisão foi de Jefferson. Ele, que já havia nos livrado de dois rebaixamentos com suas defesas espetaculares. Ele, que teve sua confiança abalada com as falhas contra o Santa Cruz, na fatídica eliminação da Copa do Brasil. Sua estrela brilhou intensamente e, nos momentos importantes do jogo, já havia realizado grandes defesas. Um apito e todos os alvinegros prenderam a respiração: mais um pênalti marcado pelo fraquíssimo Gutemberg de Paula Fonseca, que tentava a todo custo atrapalhar a decisão. O primeiro contra a meta alvinegra.
Adriano pega a bola, toma distância até a linha da grande área e, com as mãos na cintura em pose imponente, olha para o canto esquerdo do gol alvinegro. Jefferson capta a mensagem, cerra o semblante e voa no momento exato, sem nenhuma dúvida. Bola espalmada com carinho para a linha de fundo! Se não bastasse isso, uma sucessão de intervenções cruciais para garantir a vitória heróica o colocam, sem a pecha do exagero, na galeria de grandes goleiros do Glorioso. E fazem justiça ao melhor goleiro do último Brasileirão, ofuscado pela campanha ruim naquela ocasião.
Esse Botafogo tem duas caras: a raça inabalável do leão argentino Herrera e a frieza de pistoleiro da muralha chamada Jefferson. Muito obrigado aos dois, muito obrigado a Joel, a Loco Abreu e a Caio. Muito obrigado a todos os outros. Hoje o Rio amanhece feliz, ensolarado e alvinegro, como numa poesia de Vinicius de Moraes. É só um palpite, uma sensação e quase um pressentimento, mas acho que esse é o começo de um novo ciclo, muito mais agradável para os quatro milhões de fieis da religião Botafogo.
Que os anjos digam amém!
*FOTOS: André Durão / GLOBOESPORTE.COM
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